segunda-feira, 2 de agosto de 2010

A revolução


O Senhor me disse que desejava que eu fosse uma louca, de um tipo jamais visto antes". Uma suave revolução acontecerá pela humilde organização dos cristãos loucos que estão dispostos a subverter a ordem estabelecida ao reorganizar sua vida em torno da mente de Cristo. Sua questão é a transparência por meio da veracidade, e seu estilo de vida será moldado pelo evangelho de Jesus Cristo.
Se "a verdade consiste em que a mente dê às coisas a importância que elas têm na realidade", nas palavras de Jean Danielou, então o desejo de segurança, prazer e poder será avaliado de forma realista como sendo palha, e o domínio de Jesus Cristo pragmaticamente afirmado como a ordem da verdadeira realidade.
Os loucos por Cristo são violentos, como o evangelho ordena que sejam (Mt 11:12), mas a violência se aplica a eles próprios (Gl 5:24). Sua bondade é o belo fruto da reverência a Deus, da compaixão pelo mundo e do respeito a si mesmos. Suas prioridades são pessoais, determinadas não pela religião popular do momento, por políticas de poder ou pela cultura do consumo, mas pelo Sermão do Monte e pelo mistério.
Para o louco, Jesus Cristo não é um sábio ou um admirável reformador: é o segundo Adão, autor de uma nova criação. "Estou fazendo novas todas as coisas!" (Ap 21:5). Jesus redirecionou a realidade e deu-lhe uma orientação revolucionária. Jesus não arrumou o mundo. Ele o levou a uma freada barulhenta. O que ele refez a partir dos materiais humanos da velha ordem não foram pessoas mais agradáveis, com moralidades melhores, mas coisas novas (2Co 5:17).
As categorias de tais revolucionários transcendem todas as distinções classistas. Homem versus mulher, clérigo versus leigo, progressista versus conservador, carismático versus tradicional, moderno versus pós-moderno — todos estão dissolvidos no amor unificador do Espírito (Gl 3:28). As únicas exigências para ser membro é a consciência empírica de Jesus como Senhor redentor e de Deus como Aba, a rendição incondicional ao domínio do Espírito Santo e o comprometimento constante com a missão de construir o novo céu e a nova terra.
O sentido de missão entre os loucos causará destruição na vizinhança. Medos serão despertados e rumores circularão de que tais pessoas estão ficando "estranhas". Os amigos os aconselharão a se restabelecer e a fazer algo construtivo com suas vidas (como procurar segurança, prazer ou poder). Os vizinhos cochicharão que são fanáticos religiosos. Os familiares darão demonstrações ostensivas de suas realizações duvidosas. Estratagemas serão planejados para levá-los a ver e sentir como são de fato: loucos. Catherine de Hueck Doherty diz: "É como se o mundo precisasse de loucos — loucos por Cristo! Loucos pelo amor de Deus! Pois são tais loucos que mudam a face da terra".
Conforme seria de esperar (Jo 15:18), esses loucos serão ofendidos. O cristianismo hoje é basicamente inofensivo, um tipo de religião que jamais transformará coisa alguma. Jesus Cristo, o mestre revolucionário, transgrediu a ordem religiosa e política da Palestina. Os cristãos também são compelidos a transgredir e, se não o fizerem, isso é mau sinal: não estarão sendo revolucionários de fato.
Talvez a motivação da revolução ou sua inspiração orientadora possa ser mais bem descrita por um sonho que tive durante uma noite. 
Em meu sonho, vejo um homem andando no corredor da morte e uma mulher sendo preparada para receber a injeção letal num presídio. Vejo os fornos de Auschwitz e Dachau e caminhões carregados de corpos de judeus mortos circulando na noite. Vejo Hiroshima e 95 mil corpos queimados, carbonizados, irreconhecíveis, espalhados por ruas e ladeiras. Vejo o corpo amarrotado de John F. Kennedy tombado na morte. Vejo a princesa Daiana depositada num caixão fechado na catedral de Londres.
Agora vejo fileiras de cruzes fora do muro da antiga cidade de Jerusalém com centenas de corpos pregados a elas: ladrões, rebeldes, assassinos. Em uma colina, vejo mais três cruzes com os corpos de outros três homens mortos, e todos parecem ser o mesmo indivíduo; entretanto, o homem do meio parece ter sido atacado e brutalizado um pouco mais do que os outros.
Em seguida, passados dois dias, encontro-me na praça de uma grande cidade. Um grupo de homens correm ao redor como se estivessem loucos. Estão dizendo a coisa mais absurda: a crucificação do homem do meio, nas três cruzes, não fora apenas outra execução política. Estão dizendo que é o evento mais importante na história do mundo. Estão dizendo que o homem agora é o centro da fé e o objeto de adoração de homens de todas as idades e em todo o tempo por vir. Estão fora de si de tanta alegria.
Fico desnorteada. A proclamação alucinada não tem nenhum precedente em meu estudo das religiões mundiais. Não se ajusta a nenhuma das minhas categorias teológicas. Nos termos da minha compreensão religiosa, é um escândalo, uma afronta. Além do mais, esses homens parecem um pouco fantasmagóricos, e alguém está dizendo que a mulher em sua companhia fora uma prostituta. De qualquer maneira, o homem estava morto. Eu o vira, e ele estava tão morto quanto Kennedy deitado no caixão.
Mas, só para ter certeza, volto à colina. Enquanto estou ali, olhando para o que era agora uma cruz vazia, um homem surge na linha do horizonte. De algum lugar, um poderoso coro está cantando: "Rei dos reis e Senhor dos senhores".
Dou uma olhada. Já não estou só. Até onde a vista alcança, a paisagem e pontilhada por pessoas. Todas estão cantando "Rei dos reis e Senhor dos senhores". O homem se dirige a passos largos para o centro. Ele está banhado de luz. Como se duas cortinas fossem levantadas, os céus se abrem e estão repletos dos seres mais belos que eu já vira.
O homem para e levanta a mão. A terra fica em silêncio. Olho para o ele. Sua face é incandescente como o brilho do sol ao amanhecer, seus olhos fulguram como estrelas vésper. "A paz esteja com você", ele diz. Suas palavras são mais uma ordem do que uma saudação. O universo se aprofunda numa ainda maior quietude.
"Venha a mim", ele diz, "quando chamá-la por seu nome. Sim, eu sei seu nome. Eu a conheci acordada e dormindo. Antes que uma palavra estivesse na ponta de sua língua, eu sabia todas elas. Examinei cada movimento seu. Estou familiarizado com todos os seus passos. Mais do que um pastor conhece suas ovelhas, eu a conheço pelo nome. Venha a mim".
Tem início uma lista de chamada. Vejo Bob Dylan e Bono. Francisco de Assis aparece, seguido por Martinho Lutero. Vejo Howard Hughes e Dorothy Day, Adolph Hitler e Mohandas Gandhi, Nelson Rockefeller e Charles de Foucauld. Os seguintes são Agostinho e Ray Charles, o profeta Amós e Hugh Hefher, Jeremias e David Letterman, Maria e José, Paris Hilton e Brad Pitt, Pedro, Tiago e João. Kim Jong-Il e George W. Bush. Há ainda meu irmão, meu vizinho. Eles vêm sem parar. Todas as pessoas formosas, famosas e poderosas e os bilhões de anônimos, não famosos, nem celebridades.
Ouço chamar meu nome: "Rafaella". Quando dou um passo à frente, o homem olha para mim e, em seguida, através de mim. Ele olha através de todo o meu blefe e minha retórica, olha através de minhas atividades e falta do que fazer, para além de toda a minha racionalização, minimização e justificação. Pela primeira vez, sou vista e conhecida como realmente sou. Tremendo, pergunto:
Qual é a minha sentença, Senhor? Ele responde firme, mas suavemente:
Não sou seu juiz — e me entrega o Livro. — A palavra que proferi já julgou você.
Uma longa pausa. Então ele sorri. Caminho até ele e lhe toco a face. Ele toma minha mão e vamos para casa.
O conteúdo desse sonho é mais real do que esse blog. Num dia e hora exatos, conhecidos somente pelo Pai (Mt 24:36), Jesus Cristo, o Rei da glória, ofuscará o brilho de todas as pessoas formosas, famosas e poderosas que já viveram. Cada homem, cada mulher que alguma vez respirou será avaliado e medido somente em termos de sua relação com o carpinteiro de Nazaré. Esse é o reino da verdadeira realidade. O domínio de Jesus Cristo e sua primazia na ordem criada (Ef 1:10) estão no centro da proclamação do evangelho. Essa é a realidade.
Quando os loucos que buscam viver com a mente de Cristo perguntam a si mesmos "Por que existo?", eles respondem: "Por causa de Jesus Cristo". Se os anjos se perguntarem, a resposta será a mesma: "Por causa de Jesus Cristo". Se o universo inteiro de repente pudesse falar, de norte a sul e de leste a oeste, ele clamaria em coro: "Nós existimos por causa de Cristo".
O nome de Jesus ecoaria nos mares, nas montanhas e nos vales. Seria audível no tamborilar da chuva. Seria escrito no céu com raios. As tempestades rugiriam o nome "Senhor Jesus Cristo Deus-Herói", e as montanhas o ecoariam de volta. O sol, em sua marcha pelos céus rumo ao oeste, cantaria um hino ensurdecedor: "Todo o universo está repleto de Cristo".
Se houver qualquer prioridade em nossa vida pessoal ou profissional mais importante do que o domínio de Jesus Cristo, desqualificamos a nós mesmos como testemunhas do evangelho e como membros da suave revolução. Desde o dia em que Jesus rompeu os laços da morte e a era messiânica irrompeu na história, há uma nova agenda, um conjunto sem igual de prioridades e uma hierarquia revolucionária de valores para o crente.
O carpinteiro não somente refinou as éticas platônicas ou aristotélicas, reordenou a espiritualidade do Antigo Testamento ou renovou a velha criação. Ele trouxe uma revolução. Precisamos renunciar a tudo o que possuímos, não apenas a maior parte. Precisamos abandonar nosso velho modo de vida, e não corrigir apenas algumas de suas poucas aberrações. Devemos ser uma criação completamente nova, não simplesmente uma versão renovada. Seremos transformados de uma glória a outra, até mesmo na própria imagem do Senhor — transparente. A mente será renovada por uma revolução espiritual.
O pecado, naturalmente, é continuar a agir como se nunca houvesse acontecido. Quando temos fome de Deus, nos movemos e agimos, ficamos alertas e reativos. Quando não a temos, somos diletantes jogando jogos espirituais. "Deus não tem importância nenhuma, a não ser que ele tenha absoluta importância", disse Abraham Heschel.
O intenso desejo de aprender a pensar como Jesus já é um sinal da presença de Deus. O resto é operação e atividade do Espírito Santo. Suponho que a maioria de nós esteja na mesma posição dos gregos que se aproximaram de Filipe e disseram: "Queremos ver Jesus" (Jo 12:21). A única questão é: "Com que intensidade?".