domingo, 6 de fevereiro de 2011

O sofrimento e Deus.


Na maioria das vezes, nós nos sentimos totalmente  incapazes de dizer ou fazer qualquer coisa para aliviar a dor dos  que sofrem. E este sentimento de incapacidade    é  extremamente frustrante e entristecedor. Por  que  existe  o  sofrimento?
Será que a dor é um erro grosseiro de Deus? Ou  Deus  estará querendo nos ensinar alguma coisa  através dela?
Sinto-me  completamente  incapaz,  perto  de  pessoas   que sofrem. Na verdade, sinto-me até culpada. As  pessoas  estão ali sozinhas, talvez gemendo,  faces  contorcidas,    e  não consigo transpor o abismo  e  penetrar  no  seu  sofrimento.
Consigo apenas observar. Qualquer coisa que eu tente  dizer, parece-me  medíocre  e  formal,  como  se  recitasse    algo previamente  decorado. 
Tenho procurado uma mensagem que nós, os  cristãos,  possamos  dar  àqueles  que sofrem. Acima de tudo, tenho buscado  uma mensagem que possa fortalecer minha própria fé quando sofro.  Onde  está  Deus, quando chega a dor? Está ele tentando dizer-nos algo?
Entretanto,  como  uma  cristã tentando esquadrinhar o que Deus deseja neste  mundo,  tenho aprendido muito. A minha  revolta  e  amargura  contra  Deus foram desaparecendo  à medida que compreendia  por  que  ele permite um mundo com tal sofrimento.
Penetrarei no  mundo  dos  que  sofrem  para descobrir, no momento da dor, o valor  real de ser cristão.
Jamais li um poema exaltando as  virtudes  da  dor,  nem  vi jamais uma estátua erigida em sua honra ou ouvi  um  hino  a ela  dedicado.  A  dor    é    sempre    qualificada    como “desagradável”.
Realmente, os cristãos não sabem  como  interpretar  a  dor.
Muitos deles, se postos contra a parede numa  hora  difícil, admitiriam provavelmente que a dor  é  um  erro    de  Deus.
Achariam que ele devia ter tido mais cuidado e inventado uma melhor maneira de enfrentar os perigos do mundo.
Estou mesmo convencida de que  a  dor  tem  tido  propaganda injusta. Talvez devêssemos  ter  estátuas,  hinos e  poemas exaltando a dor. Qual a razão de eu assim pensar?  Porque se fizermos um exame realmente acurado, veremos a estrutura  da dor por um prisma completamente diferente.
Impressionei-me grandemente com  a  assombrosa  eficácia  da dor.
Devemos ser agradecidos pela invenção da dor. Deus  fez  o melhor. É maravilhoso!
Para muitos aspectos do  problema  da  dor,  o  Cristianismo oferece respostas que parecem  incompletas.
Uma  fé  pessoal  pode,  entretanto, tornar a pessoa  mais  apta  a  enfrentar  o  medo,  um  dos fatores-chave na reação à dor.
Pela sua própria natureza, a  experiência  de  sobrepujar  o medo é individual, e, portanto, não é uniforme.  Eu  poderia dizer:
— Expulse o medo pela confiança em Deus.
— Mas para que serviria isso? Como  se  consegue  fazer tal coisa?
A Bíblia é o guia do cristão. Creio que o esclarecimento que ela traz sobre dor e sofrimento é o grande antídoto  para o medo das pessoas  que  sofrem.  Esse  esclarecimento pode dissolver o medo como a luz desmancha a escuridão.
Quando sofro dor, tento refletir sobre o bem que a dor pode produzir em mim, conforme a promessa da Bíblia.  Em  Romanos 5:1-5,  Paulo  nos  diz  que   as    tribulações    produzem perseverança, experiência e esperança; portanto,  caráter  e confiança ou intrepidez.
Eu me perguntaria:
— Como o sofrimento pode produzir tais qualidades?
Produz perseverança, ou constância, diminuindo o meu ímpeto, forçando-me a voltar-me para  Deus,  Provando-me  que  posso vencer a crise. Isso  fortalece  o  caráter.
Continuo, ainda, a indagar como pode Deus estar envolvido no  processo do sofrimento.
A certeza de que Deus pode usar o sofrimento para produzir estas qualidades é confortante. Que o  sofrimento  é temporário e será  um  dia  recompensado.
o conhecimento deste fato pode também ser a chave para estabilizar a fé sob provação.
A Bíblia está cheia  de  recursos  à  disposição  de  quem queira afugentar o medo e o desânimo. Ler as dificuldades de Jó, fustigado pelo temor de que Deus não se importasse   com ele, pode fazer com que  o  meu  medo  seja  mais  fácil  de suportar. A história do amor  e  da  bondade  de  Deus,  que transparece em toda a Bíblia, pode ser um bálsamo   para  as minhas dúvidas. E o conhecimento sobre a oração  a  um Deus amoroso pode repelir os esforços loucos de “aumentar  a fé” na esperança de impressionar Deus. A  Bíblia mostra que não é desta maneira que a oração funciona. Deus já está cheio de solicitude  amorosa;  não  precisamos  impressioná-lo    com exercícios espirituais.
O conhecimento da dor em si, das suas funções  medicinais, também  pode  ajudar-nos  a  ter  menos  medo.  Para    mim, pessoalmente, tornou-se muito mais fácil enfrentar  uma dor, depois de  compreender  a  sua  função, na visao de Deus.
O  sofrimento  amedronta    muito  menos quando se entende o seu papel e o seu valor.
A dor não é apenas um fenômeno físico. Atitudes de medo  e desânimo afetam a intensidade da dor. Mas temos os  exemplos inspiradores daqueles  que  demonstraram  ser    o  espírito humano capaz de superar as  piores  circunstâncias. Como  o homem é tanto corpo quanto  espírito, o Cristianismo  pode oferecer uma verdadeira e benéfica esperança.
Jamais achei que o  cristão  estaria  livre  de sofrimento, porque nosso Senhor sofreu. E cheguei à  conclusão  que  ele sofreu,  não  para  livrar-nos  do  sofrimento,  mas    para ensinar-nos a suportar o sofrimento. Pois ele sabia que  não há vida sem sofrimento.
Mas, na realidade, a dor  e  o  sofrimento são muito menos do que se pensa. Como imaginar a eternidade?
É tão mais extensa do que a nossa curta vida aqui  na  terra que se torna difícil até mesmo visualizá-la.
Mas,   será razoável julgar Deus e o seu  plano  para  o  universo  pela pequenina amostra de tempo que passamos aqui na terra?
Quem  se  queixaria  se  Deus  permitisse  uma  hora    de sofrimento numa vida inteira de conforto?  Por  que,  então, nos queixamos de uma  vida  que  inclui  sofrimento,  quando aquela vida é apenas uma hora dentro da eternidade?
Segundo o esquema cristão, este mundo e o tempo  que aqui passamos não são tudo o que  existe.  A  terra  é  um campo experimental, um ponto na eternidade, mas um  ponto muito importante, porque Jesus disse que o nosso  destino depende da nossa obediência aqui. Na próxima  vez  que  você quiser clamar contra Deus em desespero angustiante,  pondo toda  a culpa nele por estar neste mundo miserável, lembre-se de que foi apresentado menos de um milionésimo da evidência, e  que é esse milionésimo que desfralda  a bandeira da rebeldia.
Ironicamente,  a  morte,  a  ocorrência  que  mais   causa sofrimento emocional, é na realidade uma transferência,  uma época de grande alegria, pois só então nós nos apropriaremos da vitória de Cristo. Descrevendo o resultado da própria morte, Jesus usou o símile  de  uma  mulher  em dores de parto, sofrendo até o momento do nascimento do  seu filho quando, então, tudo é  substituído  por  arrebatamento (João 16:2 1).
A nossa morte pode ser considerada um nascimento.
.  Quando, depois da morte, acordarmos naquele radiante mundo novo, nossas lágrimas e  dores  serão  apenas memória. Apesar de sabermos que o novo mundo é muito melhor do que este aqui, não temos condições  de  saber  exatamente como ele é. Os escritores da Bíblia contam-nos que,  em  vez do silêncio de Deus, teremos a sua presença    e  vê-lo-emos face a face. Receberemos, então, uma pedra e sobre ela  será escrito um nome, que ninguém mais sabe. O  nosso  nascimento será completo. Seremos novas  criaturas (Apocalipse 2:17).
Você pensa às vezes que Deus não ouve? Que seus gritos  de dor desvanecem-se no nada? Deus não é surdo.  Ele  está  tão mortificado pelo mundo quanto  você.  O  seu  único    Filho morreu aqui. Ele,  porém,  prometeu  pô-lo  em  ordem.  Nada desaparece simplesmente.
Esperemos pelo fim. Deixemos que a  sinfonia  arranque  as últimas notas discordantes de lamento antes  de  irromper a melodia. Como Paulo disse: “Porque para mim tenho  por certo que os sofrimentos do tempo presente não são  para  comparar com a glória por vir  a  ser  revelada  em  nós.  A  ardente expectativa da criação aguarda a revelação   dos  filhos  de Deus” (Romanos 8:18, 19).
“Porque sabemos que toda a criação a um só  tempo  geme  e suporta angústias até agora. E não somente ela,  mas também nós que temos as primícias do Espírito, igualmente   gememos em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos,  a  redenção do nosso corpo” (Romanos 8:22, 23).
Quando olhamos para trás, para a partícula  da  eternidade que foi a história deste planeta, ficamos impressionados não por sua importância, mas por sua insignificância. a terra é quase um  palito de fósforo.
E nesse simples palito de fósforo, Deus sacrificou  a  si próprio.
A dor pode ser considerada, no dizer de Berkouwer, o grande “ainda não” da eternidade. Faz-nos  lembrar  do  lugar onde estamos, e desperta em nós a  sede  do  lugar  para aonde iremos um dia.
No auge do sofrimento, falou Jó:
Quem me dera fossem agora escritas as minhas palavras!  Quem me dera que fossem gravadas em livro! Que com pena de ferro, e com chumbo, para  sempre  fossem  esculpidas    na  rocha!
Porque eu sei  que  o  meu  redentor  vive,  e  por  fim  se levantará sobre a terra. Depois, revestido este meu corpo da minha pele, em minha carne verei a Deus.  Vê-lo-ei  por  mim mesmo, os meus olhos o verão, e não outros;  de  saudade  me desfalece o coração dentro em mim (Jó 19.23-27).
Eu creio que um dia, todas as contusões,toda a dor, todo o embaraço e toda  mágoa  serão curados e todos os cruéis momentos de esperar  sem esperança serão recompensados.
Pela  fé,  apóio-me  nessa grande esperança. Se eu não acreditasse verdadeiramente  que Deus é um médico e não um sádico, e que ele sente  em  si  a presença torturante dos nervos que não estão em harmonia com o organismo”, abandonaria imediatamente  todas as tentativas de investigar os mistérios do sofrimento. A minha  irritação contra a  dor  dissipou-se  principalmente  por  uma  razão: passei  a  conhecer  Deus.  Ele    me  deu  alegria,   amor, felicidade e misericórdia. E no meio  do  meu mundo confuso e iníquo, mas a sua  presença  foi  suficiente para convencer-me de que  o meu Deus é digno  de  confiança.
Conhecê-lo vale qualquer sofrimento.
Desde o começo ele esteve presente, planejando um sistema de dor que, mesmo em um mundo decaído e rebelde, leva  a  marca do seu gênio e equipa-nos para a vida neste planeta.
Ele tem observado o reflexo de sua imagem em nós enquanto entalhamos grandes obras de  arte,  empreendemos aventuras grandiosas, sobrevivemos num misto de dor e  prazer quando ambos se entrelaçam tão intimamente   que  se  tornam quase indistinguíveis.
Ele tem usado a dor, até mesmo nas suas formas mais cruas, para ensinar-nos, pedindo-nos que nos voltemos para ele. Ele tem-se humilhado a fim de conquistar-nos. Ele tem  observado este planeta em que vivemos, permitindo  misericordiosamente que o empreendimento humano  siga o seu próprio caminho.
Ele tem permitido que clamemos aos céus e  imitemos  Jó  com estridentes e ruidosos acessos de raiva, culpando a Deus por um mundo que nós estragamos.
Ele tem-se unido ao pobre e ao  sofredor,  estabelecendo  um reino celestial que lhes é favorável, do  qual  os  ricos  e poderosos freqüentemente se esquivam.
Ele tem  prometido  força  sobrenatural  para  nutrir nosso espírito, ainda que  o  nosso  sofrimento  físico  não seja aliviado.
Ele tem-se unido a nós.  Tem  sofrido,  sangrado  e  clamado conosco. Ele tem  honrado  eternamente  aqueles  que  sofrem compartilhando da sua dor.
Ele está  conosco  agora,  ministrando-nos  através  do seu Espírito e por meio dos membros do seu corpo,  comissionados a auxiliar-nos e a aliviar-nos os sofrimentos  por  amor  de Cristo, a cabeça.
Ele está esperando e reunindo os exércitos do bem.  Um dia, ele desencadeá-los-á. O mundo verá uma última explosão de dor antes da vitória final. E, então, ele criará   para  nós um incrível mundo novo, e a dor não mais existirá.
Eis que vos digo um  mistério:  Nem  todos  dormiremos, mas transformados seremos todos, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta. A  trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados.  Porque  é  necessário   que    este    corpo corruptível se revista da incorruptibilidade,  e que o corpo mortal se revista  da  imortalidade.  E  quando  este  corpo corruptível se revestir de incorruptibilidade,  e  o  que  é mortal se revestir de imortalidade,   então  se  cumprirá  a palavra que está escrita: Tragada foi a morte pela  vitória.
Onde está, ó morte, a tua vitória? onde está, ó morte, o teu aguilhão? (1 Coríntios  15.-SI-55).


Rafaella Queiroz